quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Suécia sem palmadas sofre com crianças mimadas

Marie Märestad, o marido e as filhas
A Suécia, primeira nação do mundo a proibir as palmadas na educação das crianças, se pergunta agora se não foi longe demais e criou uma geração de pequenos tiranos. “De certa forma, as crianças na Suécia são extremamente mal educadas”, afirma à AFP David Eberhard, psiquiatra e pai de seis filhos. “Eles gritam quando adultos conversam à mesa, interrompem as conversas sem parar e exigem o mesmo tratamento que os adultos”, ressalta. O livro Como as Crianças Chegaram ao Poder, escrito por Eberhard, explica porque a proibição das punições físicas – incorporada de forma pioneira ao código penal da Suécia em 1979 – levou, pouco a pouco, a uma interdição de qualquer forma de correção das crianças. “É óbvio que é preciso escutar as crianças, mas na Suécia isso já foi longe demais. São elas que decidem tudo nas famílias: quando ir para a cama, o que comer, para onde ir nas férias, até qual canal de televisão assistir”, avalia ele, considerando que as crianças suecas são mal preparadas para a vida adulta.

“Nós vemos muitos jovens que estão decepcionados com a vida: suas expectativas são muito altas e a vida se mostra mais difícil do que o esperado por eles. Isso se manifesta em distúrbios de ansiedade e gestos de autodestruição, que aumentaram de maneira espetacular na Suécia”, diz o psiquiatra.

Suas teses são contestadas por outros especialistas, como o terapeuta familiar Martin Forster, que sustenta que, numa escala mundial, as crianças suecas estão entre as mais felizes. “A Suécia se inspirou, sobretudo, na ideia de que as crianças deveriam ser ouvidas e colocadas no centro das preocupações”, afirma Forster. Segundo ele, “o fato de as crianças decidirem muitas coisas é uma questão de valores. Pontos de vista diferentes sobre a educação e a infância geram culturas diferentes.”

O debate sobre o mau comportamento das crianças surge regularmente nas discussões sobre a escola, onde os problemas de socialização ficam mais evidentes. No início de outubro, o jornalista Ola Olofsson relatou seu espanto após ter ido à sala de aula de sua filha. “Dois garotos se xingavam, e eu não fazia ideia de que com apenas sete anos de idade era possível conhecer aquelas palavras. Quando eu tentei intervir, eles me insultaram e me disseram para eu ir cuidar da minha vida”, conta à AFP.

Quase 800 internautas comentaram a crônica de Olofsson. Entre os leitores, um professor de escola primária relatou sua rotina ao passar tarefas a alunos de quatro e cinco anos: “Você acha que eu quero fazer isso?”, disse um dos alunos. “Outro dia uma criança de quatro anos cuspiu na minha cara quando eu pedi para que ela parasse de subir nas prateleiras.”

Após um estudo de 2010 sobre o bem estar das crianças, o governo sueco ofereceu aos pais em dificuldade um curso de educação chamado “Todas as crianças no centro”. Sua filosofia: “Laços sólidos entre pais e filhos são a base de uma educação harmoniosa de indivíduos confiantes e independentes na idade adulta.” Um de seus principais ensinamentos é que a punição não garante um bom comportamento a longo prazo, e que estabelecer limites que não devem ser ultrapassados, sob pena de punição, nem sempre é uma panaceia.

“Os pais são instruídos a adotar o ponto de vista da criança. Se nós queremos que ela coopere, a melhor forma de se obter isso é ter uma relação estreita”, afirma a psicóloga Kajsa Lönn-Rhodin, uma das criadoras do curso governamental. “Eu acredito que é muito mais grave quando as crianças são maltratadas [...], quando elas recebem uma educação brutal”, avalia.

Marie Märestad e o marido, pais de duas meninas, fizeram o curso em 2012, num momento em que eles não conseguiam mais controlar as crianças à mesa. “Nós descobrimos que provocávamos nelas muitas incertezas, que elas brigavam muito [...] Nós tínhamos muitas brigas pela manhã, na hora de colocar a roupa para sair”, relembra essa mãe de 39 anos. “Nossa filha caçula fazia um escândalo e nada dava certo. [...] Nós passamos por momentos muito difíceis, até decidirmos que seria bom se ouvíssemos especialistas, conselheiros”, conta Märestad, que é personal trainer em Estocolmo.

O curso a ajudou a “não lutar em todas as frentes de batalha” e a dialogar melhor. Mas para ela, as crianças dominam a maior parte dos lares suecos. “Nós observamos muito isso nas famílias de nossos amigos, onde são as crianças que comandam.”

Segundo Hugo Lagercrantz, professor de pediatria na universidade Karolinska, de Estocolmo, a forte adesão dos suecos aos valores de democracia e igualdade levou muitos a almejarem uma relação de igual para igual com seus filhos. “Os pais tentam ser muito democráticos. [...] Eles deveriam se comportar como pais e tomar decisões, e não tentar ser simpáticos o tempo todo”, diz Lagercrantz.

Ele vê, contudo, algumas vantagens nesse estilo de educação. “As crianças suecas são muito francas e sabem expressar seu ponto de vista”, afirma. “A Suécia não valoriza a hierarquia e, de certa forma, isso é bom. Sem dúvida, essa é uma das razões pelas quais o país está relativamente bem do ponto de vista econômico.”



Nota: A estabilidade econômica não justifica a criação de pessoas desajustadas, e o argumento da brutalidade também não pode ser usado para defender o fim da disciplina, já que se trata de um extremo igualmente condenável. A experiência da Suécia mostra que, quando uma nação se afasta dos princípios bíblicos, acaba colhendo consequências negativas. Lembro-me de ter lido, anos atrás, uma entrevista publicada na revista Veja em que uma psicóloga falava que a geração criada pelos defensores da “paz e do amor” (a geração anos 60) reconheceu que a falta de limites não foi uma coisa boa para eles. Seus pais lhes deram toda a liberdade e agora eles queriam criar seus filhos de modo diferente, administrando a disciplina e impondo limites por amor. A criança que é amada entende que os pais lhe impõem limites justamente porque a amam. A Bíblia diz: “A vara e a repreensão dão sabedoria, mas a criança entregue a si mesma envergonha sua mãe” (Provérbios 29:15). E Ellen White, inspirada por Deus, escreveu: “Administrem as regras do lar com sabedoria e amor, e não com vara de ferro. As crianças corresponderão com uma obediência voluntária à regra de amor. Elogiem seus filhos sempre que possível. Tornem sua vida tão feliz quanto possível. Proporcionem-lhes diversões inocentes. Tornem a casa uma Betel, lugar santo, consagrado” (Conselhos aos Pais, Professores e Estudantes, p. 114). “A Bíblia é um guia no governo dos filhos. Nela, se os pais quiserem, poderão encontrar um curso demarcado para a educação e o preparo de seus filhos, para que não cometam erros crassos. Quando se segue esse roteiro, os pais, em vez de transigirem ilimitadamente com os filhos, usarão com maior frequência a vara do castigo; em vez de serem cegos às suas faltas, ao seu temperamento perverso, e vivos apenas para as suas virtudes, terão claro discernimento e olharão para essas coisas à luz da Bíblia. Saberão que devem governar seus filhos do modo certo” (Orientação da Criança, p. 256). [MB]